“Mestre João e Mestre Paulo”

 

“Os que afastam a amizade das suas vidas privam-se de Sol”

 

EM DETERMINADA ALTURA fui sentar-me à beira do rio, mesmo junto à foz, para ver o sol nascer. Ou talvez para que o sol me visse quando nascesse...
GOSTO DE VER O RIO. O seu leito sussurra-me que a vida está sempre a caminho, as suas margens segredam-me a importância de ter critérios para não se dispersar por mil direcções que levam a nenhures, e a sua foz, revela-me a urgência de conhecer uma plenitude para a vida, sem fronteiras que dê sentido ao que vou caminhando entre margens.
E TAMBÉM GOSTO DO NASCER DO SOL. Cada manhã que desperta é uma palavra de renascimento. “Renascer”, diz-me o sol quando acorda para mim, “Renascer”....
NÃO SERÁ ESSE O SEGREDO DOS DIAS?
E ENQUANTO ESTAVA ali sentado, vendo o sol dourar o rio, passou um barquito, junto à margem em que eu estava, vindo do lado do mar.
 - “BOM DIA”, gritou de dentro do barco um homem de rosto feliz e mãos nas redes.
 - “BOM DIA!”, disse-lhe eu.
 - COMO LHE CORREU A NOITE?”, continuei.
 - BOA, FOI BOA – disse-me ele de sorriso aberto – anunciando boas notícias a quem no mar o quis ouvir! Disse aos que tinham medo da noite, que o sol estava quase a nascer. Apontou aos que andavam perdidos, a direcção do porto de abrigo. Convidou os que nada tinham pescado a comerem do seu peixe. E sorria-lhes. Sim, sorria-lhes de alegria, enquanto lhes falava das viagens que já fez, do que nelas vi e aprendeu e do que delas estava disposto a partilhar.
E CALOU-SE... Eu, calado também, enquanto o barquito ondeava  à minha frente...
 - COMO SE CHAMA?, perguntei.
 - “CHAMAM-ME MESTRE JOÃO”
 - Mestre João, chamei-o, o que lhe colocou no rosto uma expressão delicada de atenção e disponibilidade. E a mim? Que boa notícia me dás?
ELE SOLTOU UMA GARGALHADA. Pôs o motor novamente a trabalhar, olhou-me nos olhos e disse-me, quase soletrando:
- “DEUS É AMOR!” - Que bonito, disse eu.
E SÓ UM BOCADO DEPOIS me dei conta de que no meu mundo, o AMOR serve para dizer mil coisas, e a DEUS se dão ainda mais que mil rostos diferentes! Uma frase bonita não me bastava, não me podia bastar! O MESTRE JOÃO ESTAVA A AFASTAR-SE... “MESTRE JOÃO”, gritei-lhe – o que quer dizer isso de DEUS SER AMOR?
MAS ELE JÁ NÃO ME RESPONDEU. Acho que não gostava de gritar as belezas que deviam ser quase segredadas. Mas apontou-me em direcção ao farol. Olhei, e, além do farol, apenas vi um pescador a olhar o rio como eu. Fui ter com ele...
BOM DIA, disse-lhe.
Pela idade e, sobretudo, pelo modo de olhar o rio e me olhar, percebi que também ele era Mestre nestas coisas do mar...
RESPONDEU-ME docilmente, e perguntou-me no meio de um sorriso matreiro:
Foi o Mestre João que lhe mandou vir ter comigo?
“Sim”, disse-lhe. “Claro, já é costume...
DIZ A TODOS O QUE SE SENTAM NA MARGEM DO RIO, o seu “DEUS É AMOR”, e depois manda-os vir ter aqui ao mestre Paulo para lhes explicar... Aquele brincalhão... Mas, infelizmente, poucos vêm... Quase todos depois viram as costas ao rio, com uma frase bonita nos lábios que o coração ainda não entendeu...
EU ESTAVA DELICIADO COM O FALAR DESTE HOMEM. Mas impaciente...
“ENTÃO DIGA-ME POR FAVOR, diga-me o que entender do “DEUS É AMOR!”
MANDOU-ME SENTAR. Depois, pôs-me o braço por cima do ombro, e disse-me:
“Olha meu filho, presta atenção. DEUS É AMOR, significa que DEUS é paciente, é disponível, não é invejoso, não é orgulhoso, não é vaidoso, não é inconveniente, não procura o seu próprio interesse, não se irrita, não guarda ressentimento, não se alegra com a injustiça, mas rejubila com a verdade, tudo perdoa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta.....”
O MESTRE PAULO CALOU-SE. E fez-se silêncio, mais uma vez... Depois aproximou o rosto do meu ouvido, e segredou-me:
- FILHO, GUARDA ISTO NO CORAÇÃO E SABOREIA-O. Espero que sejas capaz de chorar de alegria com a maravilha que levas dentro, e passares a não desejar outra coisa na vida senão enraizá-la em ti cada vez mais, e anunciar a outros, a sua beleza. Quando assim for, é sinal de que percebeste o que te disse. Sabes, filho, é que nestas coisas do AMOR, as lágrimas quase sempre são o selo da verdade.
E NÃO AS PERCAS ....
RECOLHE-AS NA PALMA DA MÃO e molha os lábios com elas, para que essa alegria chorada se converta em palavras que digam aos tristes, a Alegria que te encontrou, numa manhã, à beira rio, a ver o sol nascer!!