Breve história de uma faialense que casou com um príncipe russo

 

Rezam as crónicas que a faialense Carolina Street Curry da Câmara Cabral era dotada de uma rara formosura.
Filha de José Curry da Câmara Cabral, antigo senador e vice-cônsul da Rússia, e de Bárbara Joaquina Street de Arriaga, Carolina vivia, despreocupada e rodeada de afetos. Mas o destino traçou-lhe a vida no dia em que aportou à Horta um navio de guerra russo, em viagem de instrução.
Da tripulação constava o príncipe russo Constantino Meschersky, oficial da armada imperial, filho legítimo do príncipe Alexandre Meschersky e da princesa Catharina de Gabriel Meschersky.
Cumprindo o protocolo, o pai de Carolina ofereceu, no salão do seu solar, um baile à oficialidade da referida fragata, e, segundo Marcelino Lima, em Famílias Faialenses, foi a dançar uma quadrilha que Carolina e o príncipe Meschersky se conheceram e imediatamente se tomaram de amores…
Pedida logo em casamento, o que foi concedido, partiu o príncipe no seu navio. Um ano depois regressou ao Faial com um objetivo muito bem definido: casar. Assim, a 15 de março de 1866 celebrou-se, na Horta, o casamento de Carolina com o príncipe Constantino, segundo o rito católico, na então igreja da Misericórdia. E, passado um mês, realizou-se uma cerimónia nupcial, conforme o rito ortodoxo, a bordo da fragata russa “Dimitry Donskoy”, surta na baía da Horta. O príncipe Meschersky tinha então 27 anos de idade, Carolina 26. Foi a primeira e única vez que a ilha do Faial teve a glória de ver colocada uma coroa principesca na cabeça de uma das suas filhas. As testemunhas do casamento foram o pai da nubente e o dr. Miguel Street de Arriaga, secretário-geral do distrito. Tudo isto vem minuciosamente relatado nos Anais da Família Dabney no Faial (3 volumes, Instituto Açoriano de Cultura e Núcleo Cultural da Horta, Maia, 2006), cuja leitura recomendo (1).
Do casamento de Carolina com o príncipe Constantino nasceram dois filhos: Alexandre, nascido na Horta, e Waldemar, que morreria ainda muito jovem. Seguindo as pisadas do pai, Alexandre tornar-se-ia oficial da marinha russa, vindo a ser retirado do serviço durante os últimos anos do regime monárquico. 
Com os desmandos da revolução russa e a queda do império, Alexandre Meschersky, acusado de traição e vítima do “terror vermelho”, viria a ser fuzilado pelos sovietes no dia 10 de junho de 1927. Contava 58 anos de idade.
Terminava em tragédia o que começara por ser um belo e romântico conto de fadas.
Sabe-se que Carolina Curry Cabral, “distinta dama”, morreu no dia 2 de maio de 1904 quando acabava de completar 64 anos. Desconhece-se que fim teve o seu marido Constantino – apenas que serviu, lealmente, o imperador Nicolau.

Recomendo ainda, a propósito, a leitura dos livros Breviário Açoriano, pág. 186 (Tipografia Editora Andrade, Angra do Heroísmo, 1934), de Gervásio Lima; e Em dias passados, figuras, instituições e acontecimentos da história faialense, pág. 75 (Núcleo Cultural da Horta, 2007), de Fernando Faria Ribeiro.