As promessas não cumpridas

by | Nov 5, 2025 | Crónica do Atlântico

Novembro, mês de Todos os Santos, é pródigo na política à portuguesa.

Por tradição, os crentes aguardam com fervor as promessas dos orçamentos – o do Estado e o da Região -, terminando quase sempre com uma legião de mártires, desiludidos com os compromissos sacrificados no rol do esquecimento.

Vamos assistir, por estes dias, a mais uma celebração de intenções, que mete até um Conselho de Ministros dedicado às Regiões Autónomas, sem que muitas das promessas anunciadas há mais de um ano tenham sido cumpridas.

O desfile é enorme, mas refiro, agora, apenas uma, por nos dar cabo da santa paciência há longos anos, sem que os senhores governantes, do PS e do PSD, tenham alcançado a capacidade para resolver o calvário dos insulares.

Refiro-me ao abençoado Subsídio Social de Mobilidade, que nos obriga à via sacra dos CTT, para cumprir um ritual mártir sem necessidade das 12 estações, pois basta uma nos CTT pejada de gente e com pouco pessoal no atendimento para carregarmos a cruz desde o pretório de Pilatos.

Em pleno século da Inteligência Artificial, não há uma alma caridosa, nos governos da República, que ainda tivesse inventado uma fórmula para este problema.

O actual ministro das Infraestruturas, o tal que nos carregou com um tecto máximo de 600 euros, como bodo às pobres companhias aéreas, garantiu em Novembro do ano passado, em plena discussão do Orçamento de Estado, que a plataforma electrónica para o reembolso do subsídio estaria operacional “em Junho de 2025”! Estamos a entrar em Novembro de 2025, com nova aprovação de novo orçamento, e a plataforma é uma miragem.

Por cá, também temos disto.

O Governo dos Açores, no Plano de Investimentos entregue no parlamento em Outubro de 2023, garantiu que em 2024 daria início ao projecto de ligação entre Ponta Delgada e Mosteiros.

Estamos em 2025 e a promessa nem esboço de projecto tem, mas a coligação já esboçou um enorme trambolhão nas autárquicas em Ponta Delgada…

A lista de compromissos, ano após ano, já se tornou numa rotina de descrédito do “frenesim prometório regional”, tão característico nesta época outonal do ano.

Era o Centro de Saúde da Ribeira Grande, era o Centro de Saúde das Lajes do Pico, era a ampliação da pista, era o porto de Santa Iria, era a conservação dos portos e das escolas, e por aí fora.

Até o anúncio de um ferry, para transporte de passageiros e viaturas entre S. Miguel e Santa Maria, com apoios do PRR, afundou-se no meio de mais uma trapalhada concursal em que os governos regionais são peritos, seguindo o padrão do vergonhoso processo de privatização da SATA.

Nisto de meter água marítima, a República não fica atrás, quando também anunciou em Junho deste ano, com verbas no Orçamento de 2025, o lançamento de um concurso público internacional para a criação de uma ligação regular por ferry entre o Continente e as Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores.

O foguetório era visto pelo governo da República como “essencial para reforçar o sentimento de integração nacional, garantindo que os cidadãos insulares tenham acesso a serviços de mobilidade semelhantes aos do restante território”.

Conclui-se, portanto, que a afamada “integração nacional” continua para as calendas gregas.

As faltas e a inércia política que vamos assistindo na República e na Região são preocupantes.

A revisão da Lei de Finanças Regionais continua para outras núpcias, uma programação orçamental plurianual há muito prometida continua por ver a luz do dia, a gestão do endividamento público vai de vento em popa para o abismo, a privatização da SATA é uma telenovela desesperante para os contribuintes, a gestão do PRR, particularmente na linha de recapitalização, é outro desastre total sem desfecho à vista e, nós contribuintes, vamos assistindo a tudo isto com um enorme aperto na garganta e na carteira.

As finanças, que costumam ser um baluarte de sustentabilidade e qualidade de qualquer governação, estão a ser abalroadas por exigências estranhas, sem pudor e sem resistência.

Resta-nos, pois, pedir a Todos os Santos, que tenham compaixão pelos pobres insulares, que muito vão ter que rezar para fugir a esta Via Dolorosa.

Boas festas em honra de todos os santos da nossa política.

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