Esta é a história de um homem extraordinário, mas sobre cuja vida ainda há lacunas de conhecimento por preencher. Nasceu provavelmente em 1507, mas se Aveiro foi muito tempo dada como a terra natal, hoje os historiadores pendem mais para Santa Comba Dão. Quanto ao nome, Fernando Oliveira é o que se consagrou, mas na sua obra de 1536, ‘Gramática da Linguagem Portuguesa’, assinou Fernão de Oliveira. Assim se entende a razão de na introdução da edição da Gulbenkian da primeira gramática da língua portuguesa, no elogio que fazem ao autor, José Eduardo Franco e João Paulo Silvestre tenham escrito: “Fernão de Oliveira é um dos mais originais, avançados e multifacetados sábios do humanismo português.”
A faceta de “sábio” foi construída muito cedo, quando Oliveira começou a estudar com os frades dominicanos no convento de Aveiro e depois no de Évora. E confirmou-se com a publicação de obras como ‘Gramática da Linguagem Portuguesa’, ‘A Arte da Guerra do Mar ou ‘História de Portugal’. Também publicou ‘Ars Nautica’, em latim, o que significa que procurava uma audiência internacional.
Já a faceta de “avançado” tem que ver com o seu espírito crítico, condenando a forma como, por exemplo, os marinheiros eram tratados a bordo. E, caso raríssimo na época, também chamou “mau-trato” à escravatura, afirmando (segundo citação num artigo da ‘Revista Militar’ pelo contra-almirante Luís Nuno da Cunha Sardinha Monteiro): “não se achará, nem a razão humana consente, que jamais houvesse no mundo trato público e livre de comprar e vender homens livres e pacíficos, como quem compra e vende alimárias, bois, cavalos ou semelhantes”. Estas ideias fora de época valeram a Oliveira dois processos pela Inquisição e chegou a estar preso, apesar da proteção de figuras importantes como o cardeal D. Henrique. Muita da informação sobre a sua vida vem dos interrogatórios.
A faceta “multifacetada” é também surpreendente, pois deixa o convento em Évora com 25 anos e seguem-se três anos em Espanha. Depois, em 1540/1541, há uma viagem de navio de Barcelona para Génova em que é feito prisioneiro pelos franceses, que de seguida o fazem piloto de uma galé, o que revela que saberia muito de ciência náutica. Em 1545, depois de ter regressado a Portugal, volta a embarcar num navio francês, parte de uma armada que vinha do Mediterrâneo e seguia para o Canal da Mancha. Capturado pelos ingleses, o frade português impressiona Henrique VIII e o seu sucessor, Eduardo VI. Regressa a Lisboa com uma carta para D. João III enviada pelo monarca inglês. Noutra missão naval, agora como capelão, em 1552, depois de ter ajudado a levar um príncipe marroquino aliado de Portugal de volta à sua terra, é capturado com os restantes portugueses por piratas argelinos. Oliveira é um dos dois cativos que são libertados para irem a Portugal pedir ao rei que pagasse o resgate dos marinheiros.
A dada altura, a vida de Oliveira passa a ser uma incógnita. É possível que seja o Fernão Oliveira que surge num documento de 1565 recebendo uma pensão dada pela Coroa. Chegou a ser professor na Universidade de Coimbra e continuou sempre a publicar. Foi desafiado a ir para o estrangeiro, mas permaneceu em Portugal.
Terá morrido em 1581 ou 1582 e há quem diga até 1585.



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