Recordando Vasco Aguiar: as cantigas ao desafio perderam a sua grande referência

 

A semana passada fomos surpreendidos com a triste notícia do falecimento de Vasco da Ponte Aguiar, 86 anos de idade, figura incontornável das cantigas de improviso de todos os tempos. Partilhou o palco com outros grandes nomes desta arte popular, designadamente os saudosos Carvalho, Virgínio da Ponte, Turlu, Charrua, João Plácido, Caneta, Abel, Joao e muitos outros.
Conhecemos Vasco Aguiar ainda na ilha de São Miguel, aquando de uma festa do Espírito Santo na nossa terra natal no Nordeste e já então colegas e apreciadores das cantigas ao desafio eram unânimes a classificar o bom Vasco como um grande nome, não apenas pela sua invulgar capacidade de improviso, como pelo conhecimento de cultura geral, nomeadamente quando o assunto abordado era religião, para além das suas reconhecidas qualidades humanas. Vasco Aguiar era daqueles improvisadores que respeitava tudo e todos não entrando em "conversa de chacota e de insultos" como chegámos a presenciar alguns episódios hilariantes com outros cantadores. Por isso, todos os colegas e apreciadores nutriam grande respeito por ele. 
Sem mais papas na língua e muito frontalmente devo dizer que as cantigas ao desafio perderam a sua grande e principal referência, com todo o respeito e consideração que nutro por todos eles, pelos novos valores que vão surgindo, em particular o nosso amigo José Plácido, aqui em Fall River, outro que aprecio imenso, e que podemos ver na foto com Vasco Aguiar, António Alves, António Carlos, José Manuel Freire, aquando do Sétimo Convívio dos Naturais e Amigos da Bretanha, São Miguel, em novembro de 2004, no Venus de Milo, em Swansea, onde foi homenageado.
Acrescente-se que durante mais de meio século de cantigas ao desafio, Vasco Aguiar foi alvo de inúmeras homenagens, aqui nos EUA, Bermuda, Brasil, Canadá e terra de origem. Portuguese Times registou designadamente para a posteridade a festa de homenagem a este grande vulto das cantigas ao desafio na extinta Associação Académica em Fall River, em março de 2002 num apontamento do nosso amigo Afonso Costa.
No espaço de um mês, as cantigas de improviso perderam dois grandes vultos: João Ângelo, da ilha Terceira, este mais conotado com As Velhas, e que tivemos oportunidade de conhecer e entrevistá-lo juntamente com José Eliseu aqui para o Portuguese Times.
Mas por morrer uma ou mais andorinhas a primavera não acaba. Constatamos com satisfação que esta forma de arte popular continua bem viva, graças ao surgimento de novos e bons valores pelos Açores, sobretudo nas ilhas de São Miguel, Terceira e São Jorge.
A morte de Vasco Aguiar foi particularmente sentida, para além da família, amigos próximos, pelos seus colegas desta arte popular. 
José Plácido, natural da Lombinha da Maia, S. Miguel e há vários anos a residir em Fall River, um dos mais conceituados improvisadores da atualidade, com quem partilhou o palco com o saudoso Vasco durante mais de quatro décadas, refere que "Vasco era como o seu irmão mais velho, um verdadeiro poeta, um homem que nas suas cantorias como que "conversava" com os colegas de palco, de elevado nível poético e que deixa um importante e rico legado para a nova geração... Foi comigo que Vasco Aguiar cantou pela última vez. Para além desta relação de amizade de longa data e profunda, foi meu conselheiro. Jamais o esquecerei", confidenciou-nos José Plácido.
De São Miguel, Bruno Botelho, um dos novos valores das cantigas de improviso, dedicou um poema em preito de homenagem a Vasco Aguiar, e que transcrevemos apenas a sextilha com que concluí o poema:


No meu último Adeus
Tenho a alma satisfeita
És dos ídolos meus
Homem que se respeita
Só vou pedindo a Deus
Que te sente à sua direita